Titular do CBPF explica novo tetraquark
A convite do Núcleo de Comunicação Social, Alberto Corrêa dos Reis, pesquisador titular do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio de Janeiro (RJ), comenta resultado recente (e intrigante): pela primeira vez, foi detectada partícula exótica formada por quatro quarks (tijolos fundamentais da matéria) pesados. Esse novo tetraquark arrasta consigo questões que empurram a pesquisa em altas energias para a fronteira em que se acredita haver nova física.
Desde o fim da década de 1960, sabemos que os quarks são os constituintes mais fundamentais da matéria. Juntamente com os léptons (elétrons, neutrinos, múons), são as partículas que hoje acreditamos serem elementares (indivisíveis), as quais interagem entre si por meio da troca de um terceiro grupo de partículas: fótons (mediadores da interação eletromagnética), glúons (mediadores da interação forte) e os bósons W e Z (mediadores das interações fracas).
A cada partícula elementar corresponde uma antipartícula. Esta última tem carga elétrica oposta e outras propriedades – representadas pelos chamados números quânticos – também invertidas, como uma imagem da partícula refletida num espelho.
Os quarks são muito diferentes das outras partículas. Além de terem carga elétrica que é uma fração da carga do elétron (- 1/3 e + 2/3), nunca podem ser observados isoladamente, mas apenas em estados ligados, formando partículas compostas chamadas genericamente hádrons, dos quais prótons e nêutrons são os exemplos mais conhecidos.
Existem seis tipos de quarks, divididos em dois grupos: os ‘leves’ – up (u), down (d) e strange (s) – e os ‘pesados’ – charm (c), beauty (b) e top (t). São as únicas partículas elementares que podem interagir de todas as formas conhecidas, ou seja, ‘sentem’ as quatro forças da natureza.
Os exóticos
Até 2003, conheciam-se apenas dois tipos desses ‘átomos’ de quarks: os mésons – como o méson pi, descoberto pelo brasileiro César Lattes (1924-2005), ainda em 1947 –, formados por um par quark-antiquark; e os bárions, formados por três quarks.
No entanto, segundo a teoria quântica – que lida com os fenômenos em escala atômica e subatômica –, outros tipos de estados ligados de quarks são possíveis. E, segundo essa teoria, o que é possível deve obrigatoriamente existir.
Foi em 2003 – em uma das cada vez mais raras descobertas acidentais – que um novo tipo de estado foi observado, denominado X(3872). Não há ainda consenso sobre sua natureza. Essa partícula pode ser uma ‘molécula’ feita de dois hádrons, ou ainda um estado ligado de quatro quarks, denominado tetraquark. Nos anos seguintes, outros novos estados foram identificados, com propriedades distintas.
Além dos tetraquarks e ‘moléculas’, é possível haver outros tipos de estados formados por quarks, antiquarks e glúons: pentaquarks; hexaquarks; estados híbridos formados por quarks e glúons; e glueballs (partículas feitas só de glúons).
Todos esses estados, que não podem ser classificados como mésons ou bárions, são denominados hádrons ‘exóticos’. A maioria desses novos tipos de hádrons tem uma característica comum: a presença de dois quarks pesados.
Quatro pesados
Alguns desses novos hádrons foram observados pelo experimento LHCb, do Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (CERN), com sede em Genebra (Suíça), do qual participam equipes brasileiras.
No último dia 1 de julho, o LHCb publicou resultado intrigante: a observação de partícula formada por dois quarks charm e seus respectivos antiquarks. Essa a primeira observação de um hádron ‘exótico’ contendo quatro quarks pesados.
Os novos hádrons oferecem oportunidade única para o estudo da cromodinâmica quântica (QCD), a teoria das interações fortes, bem como dos mecanismos que dão origem ao ‘confinamento’, o fenômeno que impede que os quarks sejam observados isoladamente.
Há, hoje, entre os físicos, a crença de que estamos no limiar de grandes descobertas. A procura por uma nova física é o principal motor dos grandes experimentos no CERN e em outros laboratórios. No entanto, a interação mais básica entre dois hádrons – ou seja, o espalhamento (‘colisão’) entre dois píons – ainda não é complemente entendida. Há ainda aspectos das interações conhecidas que carecem de entendimento, de descrição quantitativa, baseada em princípios fundamentais.
Sem dúvida, campo vasto para novos talentos.
Alberto Corrêa dos Reis
Pesquisador titular
CBPF
Mais informações:
LHCb: https://lhcb-public.web.cern.ch/Welcome.html
CERN: https://home.cern/news/news/physics/lhcb-discovers-new-type-tetraquark-cern
LHCb no CBPF: http://www.cbpf.br/~lhcb/2_0/AboutUs.html
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